
"É sempre lindo andar na cidade de São Paulo", cantava o grupo Premeditando o Breque, na belíssima e clássica canção “São Paulo São Paulo”.
“Na grande cidade me realizar Morando num BNH Na periferia a fábrica escurece o dia”
Ah, como eles tinham razão! Estou fora da cidade há cinco anos. Vivo no Rio, a cidade maravilhosa. Lugar mágico, de belezas exuberantes entrecortadas com o urbano, esse meu verdadeiro canto...
Vira e mexe, sinto falta da minha essência. São Paulo é um vício, sem ser uma droga.
Dia desses, a saudade bateu tão forte, que busquei na música um acalanto.
Fiz uma playlist com várias canções sobre a cidade querida e desandei a ouvir.
De Gilberto Gil a Criolo, passando por Rita Lee, Tom Zé, Caetano Veloso, Itamar Assumpção e a banda 365. Essa é a minha praia musical. Do Rock a MPB.
Foram poucas as escolhas para a minha trilha sonora, das mais de 3 mil composições existentes, mas o suficiente para me sentir em casa e relaxar na varanda com o Cristo Redentor me abraçando.
Cada canção tem a sua história e seu charme. Pra dar uma animada no meu domingo, fui buscar no disco “Extra”, de Gilberto Gil, lançado em 1983 pela gravadora WEA, e produzido por Liminha, o reggae-pop “Punk da Periferia”. Uma curiosidade: na guitarra e vocais, tem a participação de Lulu Santos.
Nessa época, eu tinha 13 anos e morava no bairro da Freguesia do Ó, na Zona Norte, em um sobrado comprado com muito suor e esforço pelo meu saudoso e querido pai. Uma casa do BNH, o Banco Nacional de Habitação, citada pelo “Premê”, com o bom humor de sempre, a marca registrada do grupo paulistano.
Na minha adolescência, essa música “chiclete” bombava nas danceterias, e os punks do bairro odiavam a brincadeira musical do cantor baiano.
“Sou um punk da periferia Sou da Freguesia do Ó Ó! Ó Ó Ó Ó Ó Ó Ó! Aqui prá vocês! Sou da freguesia Sou da freguesia”.
Os bons punks da região eram "Os Inocentes" e a "banda 365". Uma galera bem bacana e que alcançou um pequeno sucesso com a música “São Paulo”.
O outono carioca lembrava a terra da garoa e fazia frio. A bela canção do “365” em homenagem a São Paulo, sem rebeldia, caiu como uma luva.
Não canso de escutar a composição do vocalista Finho em parceria com o guitarrista Ari. Ela tem valor afetivo.
“Sem São Paulo O meu dono é a solidão Diga sim, que eu digo não” E lá vou eu para mais uma faixa musical, sozinho no meu apartamento.
Sim, acertou quem pensou em Rita Lee, em outro clássico com as dificuldades e os amores imprevisíveis de São Paulo.
A música “Lá vou eu” foi lançada em 1976, no EP Rita Lee And Tutti Frutti, com quatro faixas.
“Num apartamento Perdido na cidade Alguém está tentando acreditar Que as coisas vão melhorar Ultimamente A gente não consegue Ficar indiferente”
E como estava matando saudade da minha querida e belíssima Sampa, era hora de ouvir um clássico de Caetano Veloso. O cara que deu a melhor definição para Rita Lee: a mais completa tradução de São Paulo.
A canção do cantor e compositor baiano é uma obra-prima e virou um símbolo da cidade.
“Sampa” está registrada no álbum “Muito (Dentro da Estrela Azulada), lançado em 1976.
Confesso que fiquei ansioso para saber o que vai acontecer com o meu coração quando eu retornar pra Sampa, e cruzar a Ipiranga com a avenida São João.
Saudade das galerias do centro. Das velhas lojas de discos com relíquias sonoras de encher os ouvidos.
Cada vez que visito São Paulo, tenho a impressão de que a cidade cresceu. E isso ficou mais evidente quando começou a tocar outro artista baiano: Tom Zé.
“São oito milhões de habitantes Aglomerada solidão”
Na música “São, Säo Paulo”, gravada em 1968, o cantor e compositor relata as diferenças sociais da cidade grande. Gosto de ouvir Tom Zé. Ele é um poeta, um cara teatral. Soube fazer uma leitura bem interessante de Sampa.
“São, São Paulo quanta dor São, São Paulo meu amor”
Tom Zé fez outra homenagem a três ruas famosas de São Paulo como se fossem mulheres em sua vida.
“Augusta, graças a Deus Entre você e a angélica Eu encontrei a consolação Que veio olhar por mim E me deu a mão”
O sambinha-bossa “Augusta, Angélica e Consolação”, lançada em 1973, no álbum “Todos os olhos”, me fez recordar de alguns momentos marcantes da minha vida nessas ruas, e claro, alguns amores que ficaram para trás pela vida. Essa canção me emocionou.
Nela, Tom Zé escreveu uma das letras mais lindas sobre São Paulo. Um retrato da tristeza de quem provavelmente estava perdido em uma desilusão amorosa na maior cidade da América Latina.
“Quando eu vi Que o largo dos aflitos Não era bastante largo Pra caber minha aflição, Eu fui morar na estação da luz, Porque estava tudo escuro Dentro do meu coração”
Quem não conhece o saudoso cantor e compositor Itamar Assumpção, com certeza não sabe o que foi e o que é a cena musical paulistana.
“Sampa Midnight” está na minha playlist. Ela é uma viagem de amigos bêbados na avenida Paulista regado ao jazz e as experiências da trupe musical de Itamar.
“Escabrosa noite Deu blackout na Paulista, breu no Trianon Cadê o vão do museu, sumiu Meu Deus do céu Que escuridão!”
Ela é só uma das 25 músicas que Itamar escreveu sobre São Paulo. Li, e depois pesquisei, que ele superou Adoniran Barbosa com uma composição a mais.
E antes da próxima canção, tocou o interfone. Era o entregador de comida por aplicativo. Ele chegou quando Adoniran começava a dizer que não poderia ficar nem mais um minuto com você. Ele não queria perder o trem das onze e eu o meu almoço.
*Se quiser ouvir a playlist no Spotify acesse: https://open.spotify.com/playlist/30FQ92PzEiPH5iKskXuWlW
Acesse o podcast “Toque de Primeira, A Tabelinha Entre Música e Futebol”
Por Carlos Sartori, Jornalista e radialista. Trabalha há 37 anos em TV com passagens por TV Cultura, MTV, Band, Record, SBT e Rede TV! Foi colaborador da revista Rolling Stone Brasil. Escreve um blog diário sobre esportes na ESPN e FOX Sports. Criador do podcast “Toque de Primeira, A Tabelinha Entre Música e Futebol”.
Sinta São Paulo!
Comments